Poetas e escritores de todas as épocas renderam-se ao fascínio dos gatos e com eles compartilharam suas obras e suas vidas
O
grande Guimarães Rosa adorava conversar com seus dois gatos persas. Lygia
Fagundes Telles declarou seu amor pelos gatos no livro A Disciplina do
Amor. T.S.Eliot escreveu o clássico
poema O Nome dos Gatos que inspirou o musical Cats, encenado anos
a fio na Broadway, com lotação sempre esgotada. Pablo Neruda é o autor de Ode
aos Gatos, uma das mais belas descrições da personalidade felina. Thomas
Gray escreveu um poema imortalizando sua gata Selima. Victor Hugo tinha um
diário no qual escrevia ternamente a seus gatos. A gata branca de Jorge Luiz Borges adorava dormir de barriga
para cima – é assim que aparece em várias fotos ao lado do escritor. Edgar Allan
Poe fez do gato o tema para alguns de seus melhores contos. Os gatos eram tema
constante também para Baudelaire, que dedicou a eles três poemas no seu célebre
As Flores do Mal.
Para
Ernest Hemingway os gatos eram as únicas criaturas que mereciam ser mimadas
incondicionalmente – tinha tanta paixão por eles, que chegou a ter 50 gatos, os
quais deixou protegidos em testamento,
ao morrer, em julho de 1961. O escritor determinou que seus gatos deveriam ser mantidos com todo
o conforto por meio dos rendimentos oriundos de direitos autorais de sua obra. E
assim foi feito. A casa em que morava em
Key West, na Flórida, foi transformada em The Ernest Hemingway Home & Museum e
tem como principal atração 57 bem cuidados gatos – todos descendentes dos primeiros bichanos do
escritor.
Como
esses, muitos outros escritores, poetas e pensadores de todos os gêneros renderam-se ao fascínio dos felinos e com eles
compartilharam suas obras e suas vidas. A lista é notavelmente longa: Lord
Byron, Anton Chekov, Collette, Alexander Puskin, Celine, Paul Gallico, Hermann
Hesse, H.H. Munro, Thomas Hardy, Edward Lear, Lewis Carroll, Beatrix Potter,
W.B. Yeats, Theóphile Gautier, Ray Bradbury, Colette, Honoré de Balzac, Raymond Chandler, Jean Cocteau, Marcel Mauss,
Júlio Cortazar, Alberto Moravia, Rudyard Kipling e Charles Perrault (criador
do Gato de Botas) adotaram gatos
como seus companheiros de silêncio e de escrita e adoravam ou adoram falar
deles, escrever sobre eles, transformá-los em personagens de suas
histórias.
Também
é o gato, com seus mistérios e sua ligação com o encantamento, o animal favorito
de muitos autores de ficção científica e terror, como H.G.Wells, Stephen King e Patricia Highsmith.
A lista continua com Mark Twain que, da infância compartilhada com 19 gatos, até
a velhice, nunca deixou de viver na companhia de pelo menos dois gatos. "Não se
imagina uma casa de Mark Twain onde os gatos não reinem supremos", diz um de
seus biógrafos.
Em sua fazenda em Connecticut viviam 11 gatos. Entre os intelectuais brasileiros
os “gateiros” também são muitos: Clarice
Lispector, Ana Miranda, Jorge Amado, Ruy Castro, Mario Quintana, Mauro Rasi, só para citar
alguns.
Mas
o que pode haver de tão intrínseco entre essas duas espécies – gatos e
escritores – que as une tanto? “Eles foram feitos para se entender”, afirma a
psiquiatra Nise da Silveira no livro Gato, a emoção de lidar. Conhecida
por ter transformado seus muitos gatos em co-terapeutas no tratamento de doentes
mentais, a doutora Nise nunca teve dúvida de que os gatos são os companheiros
ideais para o ser humano. “O gato é remédio para a solidão – a doença mais
devastadora de nossos dias”, afirmava. Mas seriam os escritores seres
solitários? Talvez solitário seja o ato
de escrever e, para isso, não há companhia melhor do que a silenciosa, delicada
e elegante presença felina. Talvez seja mais correto pensar que escritores têm a
alma livre, capaz de se deixar levar pelo sonho e viver outras vidas por meio de seus
personagens. Seria a liberdade – característica essencialmente felina – um
desafio para a imaginação de escritores?
Ou
será que são os gatos que procuram os escritores? Há gatos que adoram livros e
vivem em bibliotecas, como o gato Dewey, um filhote de pelo dourado abandonado
que foi adotado por uma bibliotecária da cidade de Spencer, nos Estados Unidos e
se transformou em mascote de toda a população. Ele tinha o hábito de escolher o
colo de um visitante da biblioteca para
dormir todas as tardes. Com um apurado sexto sentido – que todo apaixonado por
gato sabe ser natural nos felinos – Dewey escolhia sempre a pessoa mais carente
para mimar com seus afagos. Sua história correu os Estados Unidos e se
transformou no livro Dewey – Um gato entre livros, escrito em parceria
por Vicki Myron (a bibliotecária) e o escritor Bret Witter. Será que os gatos, de maneira geral, não se
compadecem ao ver aquela criatura diante
do teclado, em companhia apenas de seus pensamentos e letras e, intuitivamente,
decidem lhe dar carinho e atenção? Será que os gatos, que odeiam a
subserviência, não perceberiam nos escritores um espírito mais aberto, despojado
da pretensão humana de se dominar a tudo
e a todos? Ou será que os gatos simplesmente apreciam essa companhia pensativa
e silenciosa, o som do teclado, o cheiro
dos livros? Quem sabe? O fato é que muitas considerações filosóficas já foram
tecidas sobre a atração mútua entre gatos e escritores, mas não há conclusões a
respeito. Talvez este seja apenas mais um mistério felino entre tantos que vêm
desafiando a imaginação humana desde o princípio dos tempos.
Fonte: http://www.bswebsite.com.br